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No Congresso da UITP 2019, foco sobre a recuperação urbana, preservação ambiental, melhora da experiência do usuário e o tema do emprego. Por Valeska Peres Pinto

Categoria: Matérias

Publicado em 22 jul 2019

7 minutos

No Congresso da UITP 2019, foco sobre a recuperação urbana, preservação ambiental, melhora da experiência do usuário e o tema do emprego. Por Valeska Peres Pinto

Valeska Peres Pinto

Ocorrido em Estocolmo, Suécia, de 9 a 14 de junho, o Congresso da UITP 2019, como já era esperado, apresentou-se com envergadura maior do que as versões anteriores com uma presença significativa de organizações europeias.

Os relatórios finais mostram 474 expositores de 46 países; 53 sessões expositivas com 300 palestrantes; 2.718 participantes de 81 países e mais de 15.000 visitantes, e quase 170 membros da imprensa e operadores de mídias de 40 países.

A exposição – Imensa! Magnífica! – mostrou aos visitantes, efetivamente, três feiras: uma delas sobre tecnologia, outra “pró-eletrificação”, e a terceira “pró-automatização”.

Foi também uma exposição voltada para defender as pessoas como sendo o centro da mobilidade urbana.  Tudo isso revela que aquele tradicional molde de feira, caracterizado como um grande display de veículos, de equipamentos e de serviços, deu espaço a um ambiente muito mais voltado às apresentação de produtos destinados a facilitar e melhorar o acesso das pessoas aos serviços de mobilidade, assim como para melhorar a qualidade destes serviços. Daí o foco sobre as mudanças tecnológicas e de que forma elas já estão alterando e poderão alterar ainda mais a vida das pessoas em futuro próximo e de maneira positiva.

PONTOS A DESTACAR

Há pontos que quero destacar e que guardam relação com a nossa realidade de América Latina, embora, de vez em quando, o nosso sinal pareça ser de certa forma invertido quando encaramos os temas afetos à mobilidade urbana.

Mobilidade induz a recuperação urbana. O primeiro ponto a que me refiro diz respeito à ênfase dada no Congresso da UITP 2019 à ideia da mobilidade como insumo indutor da recuperação urbana ou como elemento de qualificação ou de inclusão efetiva de muitos e diferentes segmentos sociais na vida urbana.

Para nós, latino-americanos, é um pouco difícil entender isso, justamente porque, de modo geral, a área que se dedica a compreender e estimular o desenvolvimento urbano, incluindo a questão da habitação, está muito distante do campo em que atuam os operadores e os gestores do transporte público. São campos que ainda não conseguiram se encontrar. No Brasil, nem mesmo a criação do Ministério das Cidades, de efêmera existência, ajudou a aproximá-los de modo a haver maior cooperação.

Em Estocolmo, os temas relacionados ao urbanismo, levando em conta a mobilidade como vetor, esteve no centro das atenções, eclodindo em muitas exposições, manifestações e palestras, como a dizer: se a cidade não tiver sustentabilidade em outros domínios, entre os quais, por exemplo, o campo econômico o campo urbanístico, a sua mobilidade também será capenga e vice-versa.

O tema ambiental. A questão ambiental esteve presente em todos os lugares no Congresso de Estocolmo. Evidenciou-se que a mobilidade deve se colocar entre os principais instrumentos para reduzir o desperdício de energia e promover a recuperação ambiental das cidades – pois as cidades precisam muito disso.

Mostrou-se a importância de reduzir o impacto da poluição – da poluição sonora, inclusive – e, principalmente, recomendou-se a troca do modelo energético. Estavam todos dizendo: sistemas apoiados em carbono estão com seus dias contados!

Creio que quanto a esse ponto, o transporte público tem que encarar isso como uma meta. Não será de um dia para o outro, mas as cidades têm que situar a energia renovável no centro da motricidade da mobilidade urbana.

Por tudo isso, o tema da eletrificação do transporte público esteve em grande evidência no encontro. Tudo deve ser elétrico. Gigantes como a Mercedes e a Volvo também vão nessa direção, embora tenham apresentado híbridos e veículos aptos a fazer uma futura mudança, com a conversão para elétricos.

Definitivamente, no Congresso da UITP 2019 não se discutiu o diesel. A melhoria da qualidade deste combustível oriundo do petróleo figura como parte da estratégia daqueles países que não dispõem de alternativas suficientes para promoverem uma eletrificação imediata.

Melhorar a experiência do transporte. O terceiro aspecto diz respeito à necessidade que têm as cidades de melhorarem a qualidade da experiência do transporte e da mobilidade vistos como um processo integrado. Isso, considerando desde o instante que a pessoa, ainda em sua casa, toma uma decisão de empreender um deslocamento urbano, levando em conta o destino final e o retorno.

Isso está nos dizendo que a cadeia de deslocamento deve trabalhar de forma integrada e conectada. Então é preciso saber: como as pessoas fazem na ‘primeira milha’, ao sair de casa? Elas caminham? Usam bicicletas? Patins? Utilizam carro próprio? Há forma adequada de integração entre o automóvel e o transporte estrutural, como trens, metrôs e sistemas de BRT?

Dessa forma, ficou bem claro que é preciso levar em conta não apenas os trechos motorizados de transporte, mas a viagem inteira.

Ou seja, a palavra de ordem é deixar de lado a ideia de que as empresas de transporte podem se sustentarem por elas próprias, enxergando apenas o seu modo de transporte e desconsiderando todo o resto.

A saída está em garantir o desempenho das várias partes desse processo de viagem urbana, desde melhoria de calçadas até o aprimoramento dos veículos e das conexões.

A digitalização é necessária para isso. Os aplicativos já focalizam as condições em que acontecem os deslocamentos, inclusive avaliando as condições climáticas. A digitalização colabora com a eficiência das conexões de meio de transporte, mas é preciso ter claro que não adianta ter um mapa no qual esteja tudo conectado se, na prática, essas conexões forem precárias ou não existirem.

O tema do emprego. Outro aspecto apareceu em várias sessões, incluindo os pronunciamentos do presidente mundial da UITP, Pere Calvet, e do secretário-geral da entidade internacional, Mohamed Mezghani, por ocasião do encerramento do Congresso: a UITP quer alertar as empresas que atuam no âmbito da mobilidade urbana quanto à empregabilidade no setor, tendo em conta, em especial, a perspectiva de incremento da automatização das atividades e processos no transporte público urbano,

É preciso saber que impactos terá a automação sobre o setor de mobilidade urbana, que tradicionalmente sempre gerou muitos empregos. O que acontecerá com esses empregos?

É necessário observar e avaliar as características que o processo está assumindo. Por exemplo, na Europa, o setor de aquisição de bilhetes para as viagens está praticamente todo automatizado. E o que acontecerá se houver menos pessoal na operação, o segmento que sempre exigiu muita gente? Quais serão os perfis dos trabalhadores do transporte público num futuro não tão distante?  São questões pertinentes que estão a exigir medidas visando orientar aqueles que trabalham no setor para fazerem uma migração para novas habilidades e empregos.

Para concluir, digo que é perceptível que o setor de serviço na Europa também começa a se retrair no que diz respeito à oferta de empregos, e esse é um elemento importante também para a América Latina e, portanto, devemos estar atentos a ele.

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