Categoria: Matérias
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Publicado em 3 out 2018
6 minutos
ROSIMAR GONÇALVES *
A Lei nº 12.587/12, que estabelece a Política Nacional de Mobilidade Urbana no Brasil, define mobilidade urbana como sendo a condição de deslocamento de pessoas e de cargas no espaço viário das cidades. Dessa maneira, a legislação inclui a importância na qualidade da circulação das pessoas e também das mercadorias como fator preponderante para o desenvolvimento da vida e da economia nas cidades.
Torna-se de grande relevância a compreensão do significado de logística urbana, que engloba, além da distribuição das mercadorias, toda a dinâmica do produtor até o consumidor final, as necessidades dos atores que participam desse processo e a definição do papel que cabe ao gestor público em sua gestão sistêmica, já que, de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, é ele o responsável pelo planejamento, uso e fiscalização do sistema viário das cidades.
A estrutura atual da distribuição de mercadorias no Brasil é o que se pode chamar de entrega ponto a ponto, ou seja, uma tática por meio da qual o produtor/vendedor/distribuidor define individualmente como entregar seus produtos para os mais diferentes tipos de comércio/cliente.
Essa entrega nas cidades leva em conta a melhor utilização dos veículos e funcionários de cada distribuidor ou centro de distribuição privada, com o objetivo de alcançar o seu melhor custo-benefício. Ocorre, porém, que ao considerar a melhor solução para si, tendo em vista as suas necessidades e a busca de seus resultados, cada distribuidor concorre, na prática, com diversos outros distribuidores pelo mesmo espaço viário.
Longe de cumprir a tarefa de organizar a distribuição de mercadorias, no Brasil, o gestor público se limita essencialmente a estabelecer restrições de horários e vias e a definir vagas de carga e descarga. Respeitadas essas restrições e definições, a operação na cidade pode continuar sendo definida individualmente pelos fornecedores e seus clientes sem nenhum conhecimento de quem é responsável pelo sistema viário: gestor público.
Considerando o trânsito e a organização das cidades, uma maneira positiva de tratar essa questão seria adaptar para as condições brasileiras aquilo que já acontece na maior parte das grandes e médias cidades dos países com planejamento real da mobilidade urbana: o estabelecimento da prática de gestão pública sistêmica da distribuição da carga urbana, que consiste em diagnosticar a movimentação do conjunto de mercadorias tipificadas consumidas em cada setor da cidade e, a seguir, estruturar uma rede para tal distribuição, constituída por diversos distribuidores que atuem em conjunto e não mais individualmente.
A reestruturação desse processo do abastecimento urbano depende da compreensão de suas vantagens e de um acordo entre as partes envolvidas, ou seja, a promoção do debate entre os atores envolvidos no processo – fabricantes, distribuidores, transportadores, comerciantes, varejistas, consumidores, moradores – e deverá ser coordenado pelo gestor público, com o objetivo de elaborar um Plano Municipal de Logística Urbana – PMLU. Essa distribuição em rede poderá ter sua operação incluída nas centrais de monitoramento de transporte público e segurança das prefeituras e o município saberá quantos caminhões estarão circulando em cada região em cada momento do dia.
O PMLU estabelecerá uma rede de entregas baseada em banco de dados que quantifique os tipos de mercadorias consumidas em uma região, tipo de veículos necessários para esse abastecimento, número de fornecedores e clientes, horários estabelecidos, itinerários sem sobreposição, necessidades diferenciadas dos atores envolvidos etc. O número de caminhões não será mais em função do número de fabricantes para um mesmo produto, mas em função da quantidade consumida daquele tipo de produto naquela região; por exemplo, o mesmo caminhão de bebidas entregará qualquer marca de bebida naquela mesma viagem.
Na prática, a substituição na forma da entrega ponto a ponto será para o sistema de hub-and-spokes ou portos secos – equivalentes aos terminais ou estações de transferência na rede de transporte público – a serem instalados em vários locais da cidade. Em sistema troncal, armazenarão como pivôs as mercadorias de diferentes distribuidores/ fornecedores e, depois, em linhas alimentadoras, efetuarão a distribuição final de forma conjunta por tipo de mercadoria e tipo de veículo necessário para cada região.
Um aeroporto internacional para onde convergem aviões procedentes do Exterior exerce essa função de hub-and-spoke; nesse caso, os passageiros desembarcam nele de uma mesma origem e depois em aviões menores ou em outros tipos de veículos completam a viagem até seus respectivos destinos finais.
Em uma área central com calçadões exclusivos para pedestres, onde não haja espaço no viário para a delimitação de uma área adequada para a descarga de caminhões, poder-se-á reservar vagas dentro de um estacionamento privado ou em dependências de um hipermercados (com alguma forma de atrativo, como isenção fiscal) em dias pré-definidos da semana; tais vagas servirão como ‘mini-hub-and-spokes’ para aquela região. A entrega final pode ser feita com veículos menores em um raio de distância pré-determinado para esse fim.
Um primeiro passo precisa ser dado pelo gestor público para que o sistema viário seja organizado também para a circulação de mercadorias e não só para a circulação de pessoas, como é feito hoje.
[padding type=”full_right”]* Aluna Especial de Doutorado em Arquitetura – UNICAMP/FEC – Área de Concentração: Arquitetura Tecnologia e Cidade; Mestranda em Engenharia Civil – UNICAMP/FEC – Área de Concentração: Transportes; Tecnóloga em Construção Civil na modalidade de Movimento de Terra e Pavimentação-UNESP/FATEC-SP.[/padding]
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